Medicamento produzido na UFMG traz avanço no diagnóstico de câncer de mama no Brasil

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Exame feito com o fluoroestradiol ajuda na definição de estratégias para o tratamento da doença (Agatha Azevedo/CDTN)

Um novo avanço no diagnóstico e no potencial tratamento do câncer de mama no Brasil veio do CDTN (Centro de Desenvolvimento da Tecnologia Nuclear), unidade de pesquisa localizada no campus da UFMG. O centro foi o primeiro a receber a aprovação para comercializar o radiofármaco fluoroestradiol, que auxilia a biópsia em pacientes com câncer de mama metastático ou recorrente.

Com o nome comercial de Radiofes, agora o medicamento já pode ser usado em clínicas médicas para auxiliar na identificação dos tumores e ajudar no desenvolvimento de estratégias para seu tratamento. O radiofármaco ainda pode contribuir para que o câncer seja diagnosticado antes mesmo de outras evidências aparecerem, como os nódulos que podem ser identificados em exames de toque.

O farmacêutico Leonardo Tafas, coordenador de produção do radiofármacos no CDTN, explica que o fluoroestradiol já é utilizado em países como os Estados Unidos. Com a decisão da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) de permitir a isenção de registro para alguns radiofármacos, a aprovação para a comercialização no país foi simplificada.

O que é um radiofármaco?

Para entender como o fluoroestradiol atua no corpo, primeiro é importante entender o que é um radiofármaco. O especialista explica que se trata de uma classe de medicamentos com finalidade diagnóstica ou terapêutica. Na maioria dos casos, eles têm finalidade diagnóstica.

“Se colocarmos um átomo radioativo no corpo, ele se espalha pelo corpo todo, não vai para nenhum lugar específico. Mas quando ligamos quimicamente um átomo radioativo a uma molécula que tem afinidade por alguma parte do corpo, isso traz especificidade a este átomo. Dessa forma, com um método não invasivo, conseguimos saber onde ele foi parar”, explica Tafas.

Já dentro do corpo, o material consegue detectar alterações metabólicas nas células, que, em casos de câncer, precedem alterações anatômicas perceptíveis ao toque, como os nódulos. E quanto mais cedo o diagnóstico for feito, maiores são as chances de cura.

A identificação da alteração metabólica se dá por meio da Tomografia por Emissão de Pósitrons (PET). O paciente recebe o radiofármaco injetado, passa pelo exame e o equipamento detecta a radiação.

Uma tomografia computadorizada faz a imagem anatômica do corpo e o resultado é um mapeamento com precisão milimétrica, mostrando em que parte do corpo há um processo metabólico normal ou anormal – apontando ou não para uma doença.

Imagem de tomografia PET
Resultado do exame é um mapeamento específico das possíveis alterações metabólicas das células (MDPI/Divulgação)

O fluoroestradiol

O fluoroestradiol é um agente de diagnóstico radioativo análogo ao estrogênio, ou seja, que tem uma estrutura química similar à desse hormônio. Por isso, ele é utilizado para detectar tumores que expressam receptor de estrogênio. A maioria dos tipos de câncer de mama expressam esse receptor em uma quantidade maior que a normal.

Com o exame, o médico consegue identificar se há um processo metabólico anormal em alguma região e avaliar a situação a partir de outros dados clínicos, como exames de sangue. Dessa forma, é possível saber se o câncer é tratável ou se um tratamento já em curso está funcionando.

Aplicação

De acordo com Leonardo Tafas, o fluoroestradiol é um radiofármaco muito mais específico do que outros disponíveis no mercado. Com a comercialização, clínicas e hospitais ao redor do país já começaram a entrar em contato para firmar contratos e usar o medicamento.

A função tradicional do fluoroestradiol é em casos de pessoas que já têm o diagnóstico do câncer de mama, auxiliando na definição de estratégias para o tratamento da doença, além de identificar potenciais metástases.

“Mas nada impede que um médico faça o exame em um paciente que já tem um histórico de câncer de mama na família, por exemplo, e quer tentar adiantar um possível diagnóstico”, completa o farmacêutico.

O coordenador de produção ainda reforça a importância de que a população saiba da possibilidade de uso do fluoroestradiol e converse com os próprios médicos para demonstrar o interesse em usar o radiofármaco no tratamento.

A ciência no Brasil

A aprovação da comercialização do fluoroestradiol no Brasil veio em meio a um momento de cortes e incertezas para a ciência no país. De acordo com Leonardo Tafas, a cada ano, o valor repassado pelo governo federal ao CDTN, centro vinculado ao Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), é menor.

“No Brasil temos muita dificuldade de começar algo do zero, falta investimento, pessoas para a pesquisa… Não temos condições de bancar muitas produções, e com os repasses cada vez menores não conseguimos desenvolver tudo que poderíamos. Muita coisa vai ficando para trás”, conta.

O CDTN começou a sintetizar o fluoroestradiol em 2016, depois de comprar toda a matéria-prima, e desenvolveu mais a produção a partir de 2018. Em dezembro de 2020, a Anvisa sujeitou alguns radiofármacos a uma isenção de registro, diminuindo a burocracia para a comercialização das substâncias. Em setembro deste ano, o centro obteve a autorização para comercializar o Radiofes.

 


 

Edição: Giovanna Fávero

Com BHZ